A Ceia do Senhor é uma experiência que estremece a alma, por
causa da profunda significação que traz. Foi durante a antiga celebração da
Páscoa, na véspera de Sua morte, que Jesus instituiu uma nova e significante
refeição, uma “refeição de comunhão”, a qual observamos até os dias de hoje, e
que é a mais alta expressão da adoração cristã. É um “sermão vivido”,
relembrando a morte de nosso Senhor e ressurreição, e vislumbrando o futuro em
que retornará em Sua glória.
A Páscoa era a festividade mais sagrada do ano religioso
judaico. Comemorava a praga final no Egito, quando os primogênitos dos egípcios
morreram e os israelitas foram poupados por causa do sangue de um cordeiro que
fora aspergido em seus portais. Então o cordeiro foi assado e comido com pão
sem levedura. A ordem de Deus foi que através das gerações vindouras a
festividade fosse celebrada. A história está registrada em Êxodo 12. Durante a
celebração, Jesus e os discípulos possivelmente cantaram juntos um ou mais dos
`Salmos Aleluia” (Salmos 111-118). Jesus, tomando o pão, deu graças a Deus. Ao
parti-lo e distribuir aos discípulos, disse: “Tomai, comei; este é o Meu corpo
que é partido por vós.” Do mesmo modo, tomou o cálice, e depois de ceiar,
deu-lhes o cálice, e dele beberam. Ele disse: “Este cálice é o novo testamento
no meu sangue, que é derramado por vós; fazei isto em memória de Mim.” Ele
concluiu a ceia cantando um hino e eles saíram pela noite até ao Monte das
Oliveiras. Foi lá que Jesus foi traído, como predito, por Judas. No dia
seguinte, Ele foi crucificado. Paulo inclui uma afirmação não encontrada nos
Evangelhos: “Portanto, qualquer que comer este pão, ou beber o cálice do Senhor
indignamente, será culpado do corpo e do sangue do Senhor. Examine-se, pois, o
homem a si mesmo, e assim coma deste pão e beba deste cálice. Porque o que come
e bebe indignamente, come e bebe para sua própria condenação, não discernindo o
corpo do Senhor” (I Co 11:27-29). Podemos perguntar o que significa participar
do pão e do cálice “indignamente”. Pode significar ignorar o verdadeiro
significado do pão e do cálice, e se esquecer do tremendo preço que nosso
Salvador pagou por nossa salvação.
Ou pode significar permitir que a cerimônia se torne um
ritual morto e formal, ou vir à Mesa com pecado não-confessado. Para guardar a
instrução de Paulo, cada um deve examinar a si mesmo antes de comer do pão e
beber do cálice, em observância ao aviso.
Outra afirmação de Paulo que não se encontra incluída nos
Evangelhos é “Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este
cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha” (I Co 11:26).
Isto coloca um limite de tempo à cerimônia: até a volta de
nosso Senhor. Através destes breves relatos aprendemos como Jesus usou dois dos
mais perecíveis elementos como símbolos de Seu corpo e sangue, e os inaugurou como
um monumento à Sua morte. Não foi um
monumento de mármore esculpido ou latão moldado, mas de pão e suco de uva. Ele
declarou que o pão testemunhava de Seu corpo que seria partido: não houve
sequer um osso partido, mas Seu corpo estava tão terrivelmente moído, que
dificilmente se reconhecia (S l 22:12-17; Is 53:4-7). O suco de uva
testemunhava de Seu sangue, indicando a terrível morte que em breve
experimentaria.
Ele, o perfeito Filho de Deus, se tornou a realização de
incontáveis profecias do Velho Testamento a respeito do Redentor (Gn 3:15, Sl
22, Is 53, ). Quando Ele disse: “Fazei isto em memória de Mim”, indicou que
esta era uma cerimônia a ter continuidade no futuro. Também indicou que a Páscoa, que exigia a
morte de um cordeiro e vislumbrava a vinda do Cordeiro de Deus que tiraria o
pecado do mundo, se fazia agora obsoleta. O “Novo Testamento” tomou seu lugar
quando Cristo, o Cordeiro da Páscoa (I Co 5:7), foi sacrificado (Hb 8:8-13). O
sistema sacrificial não se fazia mais necessário (Hebreus 9:25-28).
Os principais textos que nos falam acerca da instituição da
Ceia na Igreja de Cristo são:
- Mt
26:26-29;
- Mc
14:22-25;
- Lc
22:19-20;
- Jo
6:48-58;
- At
2:41-46; 20:7,11;
- ICo 10:15-17; 11:23-26.
Vemos que esta ordenança é chamada de partir o pão (At
2:42,46, 20:7, 11) e de Ceia do Senhor (I Co 11:20). Seria bom notar que estas
são as únicas ocorrências destes termos na Bíblia. Apesar da maioria das
igrejas locais adotarem o segundo nome, não é errado se referir a Ceia do
Senhor como o partir o pão. Já a expressão Santa Ceia deve ter sido introduzida
no vocabulário de algumas igrejas locais com a melhor das intenções, contudo
não é uma expressão tirada das Escrituras Sagradas.
Como pudemos observar os textos são muito sucintos e nenhum
deles nos ensinam a forma de celebrar a Ceia do Senhor.
Quanto a forma, o que vemos é uma celebração simples e
desprovida de liturgia, ritos e "trajes especiais" (Isto não quer
dizer que o conteúdo e/ou o significado não sejam ricos e profundos).
Outro ponto importante é que o Senhor usou elementos comuns
aos costumes judaicos para instituir a Ceia. Ele não criou nada novo. O Pão era
um dos que já estavam à mesa, o mesmo pode se dizer a respeito do vinho. Eram
elementos comuns da alimentação diária daquele povo. O fato de estarem à mesa
compartilhando uma refeição era algo muito significante na cultura oriental.
Comer com alguém era muito mais do que simplesmente se alimentar; significava
associação, comunhão, compromisso e interesse mútuo.
Os três relatos dos Evangelhos e o relato de I Coríntios se
complementam e incluem as principais características da Ceia. Mateus e Marcos
combinam entre si, bem como Lucas e Paulo também. A diferença principal entre
estes dois grupos são que Mateus e Marcos omitem a frase "fazei isto em
memória de mim" e incluem "derramado em favor de muitos" depois
de se referirem ao sangue da aliança. Lucas diz: "derramado por vós."
Em lugar da observação que o Senhor fez da Sua futura reunião com os discípulos
no Reino de Deus, Paulo faz referência a proclamação da morte do Senhor
"até que ele venha". Estas palavras de Paulo refletem, de forma
inequívoca, a esperança escatológica da volta do Senhor para arrebatar a Sua
Igreja. Esperança esta que é, por assim dizer, reavivada pela celebração da
Ceia do Senhor. É também através de Paulo que tomamos conhecimento do profundo
significado da Mesa do Senhor como uma comunhão (koinonia) com o Senhor ( 1 Co
10:16). É de bom tom lembrar que a nossa comunhão não é com o Cristo morto e
sim com o Senhor ressurrecto, vitorioso, glorificado e poderoso. Paulo também
nos mostra a unidade da Igreja, pois assim como compartilhamos de um único pão,
assim também nos reunimos como um único corpo de Cristo (I Co 10:17). Assim
vemos que a Ceia do Senhor simboliza não somente o próprio corpo e sangue do
Senhor Jesus, mas também o Seu Corpo místico, que é a Igreja. Quando
"todos participamos do mesmo pão" isso significa, entre outras
coisas, que nós, apesar de sermos individualmente muitos e diversos, nesse ato
ficamos sendo uma coisa só: um "pão" ou um "corpo", ou como
se fala em I Co 2:5, um "sacerdócio" (S. E. Mac Nair. Cartas
Ocasionais, p. 120).
Quando Paulo se refere à noite em que o Senhor foi traído,
nossas mentes são levadas aos textos que narram da instituição da Ceia. Nos
deteremos, um pouco, nas palavras proferidas por Jesus naquela noite, buscando
entender o significado delas. Passemos a uma comparação entre as narrativas:
- Mateus: "Tomai comei; isto é o meu corpo".
- Marcos: "Tomai, isto é o meu corpo".
- Lucas: "Isto é o meu corpo oferecido por vós; fazei
isto em memória de mim".
- Mateus: "Isto é o meu sangue da [nova] aliança,
derramado em favor de muitos para a remissão de pecados".
- Marcos: "Isto é o meu sangue, o sangue da nova
aliança derramado em favor de muitos".
- Lucas: "Este é o cálice da nova aliança no meu sangue
derramado por vós".
A ceia é uma demonstração de que a essência da vida cristã;
é receber a Cristo como alimento espiritual. "Quem comer a minha carne e
beber o meu sangue, permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive me
enviou, e igualmente eu vivo pelo Pai, quem de mim se alimenta, por mim
viverá" (Jo 6:56,57).
Portanto, a fé é algo fundamental ao participarmos da Ceia.
O mero participar da Ceia não traz os benefícios da obra de Cristo, estes devem
ser apropriados pela fé. O cristão deve alimentar a sua alma com Cristo (Jo
6:51), e a Ceia é apenas uma figura disso. Cristo é o Senhor da mesa, mas Ele
não pode ser dado e recebido automaticamente pela simples realização do ritual
da Ceia. Outra frase de Jesus que é repetida duas vezes por Paulo é:
"fazei isto em memória de mim" (Lc 22:19; I Co 11:24,25). Esta ordem
tem por finalidade que nós não nos esqueçamos a obra redentora que ele efetuou
na Cruz do Calvário em nosso favor. Seria
o mesmo que dizer, "em lembrança de mim" ou "em recordação de
mim". Ou seja, ao realizar a Ceia Memorial, a igreja lembra a morte
sacrificial de Jesus Cristo e a realidade dos benefícios advindos deste ato. Em
outras palavras a Ceia é uma dramatização que nos recorda o que aconteceu no
Calvário.
O pão ao ser quebrado nos lembra que Cristo foi "moído
pelas nossas iniqüidades"(Is 53:5; Tt 2:14; I Pe 2:24;Hb 10:10). O
vermelho do vinho nos lembra que Ele derramou seu sangue para tirar o nosso
pecado, nos santificar e nos aproximar de Deus (Ef 1:7, 2:13; Cl 1:20; Hb 9:28,
10:19, 13:12; I Jo 1:7; Ap 1:5, 5:9). Ao
celebrarmos a Ceia, os benefícios advindos do sacrifício do Senhor Jesus devem
ser trazidos à nossa memória e gerar no nosso coração um sentimento de profunda
gratidão e adoração a quem tanto nos amou. Na Ceia, a Igreja, o Corpo vivo de
Cristo, vislumbra as melhores coisas que Deus tem preparado para nós, tornando
viva a nossa bendita esperança (Tt 2:13).
A Ceia do Senhor apresenta uma tríplice perspectiva:
- Passada lembra um evento e revive sua realidade e valor;
- Presente, anuncia e dramatiza a obra redentora do Senhor,
convocando a Igreja ao cumprimento da sua missão; e,
- Futura, exorta seus participantes à espera do Senhor
glorificado que vira consumar o plano de Deus. E, nessa tríplice perspectiva, a
Ceia é o mais forte elo da unidade corporativa da Igreja cristã, "porque
todos participamos do único pão" (I Co 10:17 - Dicionário Internacional de
Teologia do Novo Testamento. p. 415). Existem hoje quatro posições mais comuns
acerca da Ceia do Senhor. São elas:
- Transubstanciação (Católica Romana): no momento da Ceia
(eucaristia) os elementos são transformados no sangue e corpo de Cristo.
- Consubstanciação (Luterana): o corpo e o sangue de Cristo
estão presentes e combinados com os elementos da Ceia.
- Presença Espiritual (Calvino): Cristo está presente com os
elementos.
- Memorial (Zwingli, Batista, Pentecostal, Irmãos): os
elementos são somente símbolos, e a presença de Cristo é relativa à fé do
participante. Cada um tem que tomar a Ceia com a atitude correta e com fé.
Detalhes Importantes:
Cristo não tinha morrido quando institui a aliança. O
propósito é proclamar a morte do Senhor, não recrucificá-lo. O uso da linguagem
inclui metáfora (Ex.: isto é o meu corpo; ou, este é o cálice da nova aliança).
Não é usada uma linguagem literal assim como "eu sou a porta" também
não é.
No entanto, tendo visto tão grande riqueza de significados
belos e profundos, é de se estranhar que elementos alheios à Ceia do Senhor
tenham sido introduzidos na sua celebração; tomando vulto de grande importância
e usurpando o lugar do Senhor. Aquilo que era para ser singelo foi acumulado de
um ritualismo que tira a nossa atenção do essencial. Em algumas igrejas locais
o horário, a mesa, toalhas, guardanapos, paletó, gravata, cálice ou cálices,
pão com ou sem fermento, tem tido mais destaque que o Senhor da Ceia. São
tantas regras e preceitos que a simplicidade e a singeleza com que era
celebrada pela igreja de Atos a muito ficou para trás. Temo que alguns irmãos
estejam beirando a idolatria quando dão demasiado valor a mesa e a toalhas
chegando ao ponto de deixar de participar da Ceia quando um destes detalhes não
estão de acordo com o seu gosto pessoal. Digo gosto pessoal com a convicção de
que estas coisas são regras humanas que não se encontram na Bíblia. E se não estão
na Palavra de Deus não deveriam ser impostas na Igreja do Deus da Palavra. Criticamos,
e com razão, as igrejas que dão ao pastor a exclusividade de repartir os
elementos, mas em algumas igrejas locais a distribuição dos elementos é
exclusividade de presbíteros e diáconos; e isto se estiverem devidamente
uniformizados. Alguns dizem: "quem vai participar da Ceia pode vir sem
paletó, mas quem vai servir deve trajar paletó e gravata." Ai cabem duas
perguntas:
(a) quem é mais importante, o que distribui os elementos ou
o que recebe?
(b) onde, na Bíblia, é exigido traje especial para servir a
Ceia?
Para a primeira pergunta a resposta é: "nenhum dos dois
e sim o Senhor." A segunda resposta é: "Além da exortação de que o
cristão deve se trajar decentemente (não só nas reuniões da igreja), em nenhum
lugar encontramos tal instrução". E assim, em muitos lugares é dada tanta
ênfase a forma que o conteúdo sofre detrimento.
Quando privamos um irmão de, em qualquer dos dois aspectos,
de participar da Ceia, que não é nossa, mas do Senhor, por motivos alheios à
Sua Palavra, estamos pecando. "Receio muito a ocupação com formas e ritos:
com a matéria e não com o espírito - que é Cristo. Tenho notado que uma
demasiada ocupação com a parte material do serviço tende a depreciar a parte
espiritual"
Existe uma situação muito comum nas igrejas locais.
Refiro-me as pessoas que deixam de participar da Ceia por acharem que um irmão
não está participando dignamente. Mais uma vez gostaria de compartilhar com
vocês o conselho de um sábio:
"Alguns, com uma facilidade extraordinária, afastam-se
da Ceia em qualquer ocasião em que não aprovam a conduta de alguém ali: um modo
de proceder que a Escritura não ensina.
Que Deus nos ajude a fazer parte constantemente desta mesa
gloriosa que significa o elo de comunhão de todo o cristão com o Senhor Jesus
até que Ele venha nos buscar para si, amém!
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